Estudo revela que planta usa 'bomba de pólen' para retirar grãos de rivais do bico de beija-flores
13/01/2025
Com um mecanismo explosivo, comportamento da Hypenia macrantha é um dos raros casos de competição masculina no reino vegetal. Mecanismo não só deposita pólen no bico dos beija-flores, como também remove os grãos de rivais que ficaram aderidos antes
Bruce Anderson e Vinícius Brito
Por não se moverem, as plantas contam com a ajuda de polinizadores como borboletas, abelhas, beija-flores e outros animais para levar o pólen de uma flor para outra. No entanto, algumas plantas desenvolveram estratégias inesperadas para garantir que seu pólen seja priorizado.
Um exemplo fascinante é o da Hypenia macrantha, uma espécie nativa do Cerrado brasileiro, que utiliza um mecanismo de “bomba de pólen” para disputar espaço no bico dos beija-flores, removendo pólen de outras flores e substituindo-o pelo seu.
Esse comportamento foi descrito em um estudo conduzido pelo botânico Vinícius Brito, da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Segundo Brito, o pólen da H. macrantha é lançado por um mecanismo floral semelhante a uma catapulta.
Hypenia macrantha é nativa do Cerrado brasileiro
Laurent Quéno / iNaturalist
Ao ser acionada pelo toque do beija-flor, essa estrutura arremessa o pólen em alta velocidade, removendo até 75% dos grãos previamente aderidos ao bico do polinizador, como se fosse uma jogada de sinuca. “Trata-se de um exemplo raro de competição masculina nos vegetais”, destaca o pesquisador.
Segundo Brito, é possível que, no passado, as flores que conseguiram retirar mais pólen de outras plantas e depositar o seu tiveram uma vantagem reprodutiva, deixando mais descendentes. “Esses descendetes provavelmente herdaram essa característica e, com o tempo, essa característica se tornou mais comum entre essas plantas, ou seja, ocorreu evolução”.
“Já se acreditou que esse mecanismo de explosão serviria apenas para garantir a deposição dos grãos de pólen no corpo do polinizador, mas nosso estudo demonstrou pela primeira vez que flores explosivas retiram os grãos de pólen de outras flores. Esse tipo de competição entre funções masculinas é bastante descrito nos animais, mas pouquíssimo estudado em plantas”, afirma o botânico.
Após explosão, novos grãos de pólen ficam aderidos no bico do polinizador
Bruce Anderson e Vinícius Brito
O pesquisador explica que, no Brasil, existem plantas em outros gêneros que também possuem o mesmo mecanismo de explosão.
“O gênero Hyptis, por exemplo, tem flores explosivas que são polinizadas por abelhas. O gênero Mucuna tem flores explosivas polinizadas por morcegos ou aves. E também existem flores explosivas em outros países”, completa.
Cerca de 94% das plantas têm flores hermafroditas, muitas delas com uma fase masculina e outra feminina. Quando a ave destrava a catapulta de H. macrantha, a flor, que estava na fase masculina, começa uma transição de dois dias para a fase feminina.
A partir daí, ela se torna capaz de receber o pólen de outras flores. Segundo Brito, como a erva tem até dez flores, parte delas na fase masculina, a ave pode visitar mais de uma flor na mesma planta, o que amplifica a força competitiva. “A cada flor, mais pólen fica grudado no bico, substituindo o de plantas visitadas antes”, ressalta.
Como isso foi provado?
Para verificar a eficiência do sistema de remoção de pólen, os pesquisadores coloriram grãos de pólen com pontos quânticos, que são nanopartículas que fluorescem sob luz ultravioleta. Assim, poderiam localizá-las depois de transportadas.
Crânio de beija-flor com pólen depositado (à esquerda) e grãos marcados com pontos quânticos (à direita)
Daniela Calaça / UFU
Depois, usaram um crânio de beija-flor para depositar o pólen colorido no bico e contaram quantos grãos ficaram presos, usando um microscópio. Introduzido em uma flor, cujo pólen não tinha recebido a coloração, o bico destravou a catapulta e os pesquisadores contaram quantos grãos coloridos continuavam aderidos ao bico. Segundo Brito, a explosão removeu, em média, 40% do pólen do bico. Em uma das flores, a remoção chegou a 75%.
A velocidade da erupção, medida em vídeo, foi de 2,62 metros por segundo, cerca de 9,5 quilômetros por hora. O equivalente à de uma pessoa em corrida moderada. Isso faz da ejeção de H. macrantha uma das mais rápidas entre as plantas.
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